Escrita por: Pedro Rubens
Qual é o limite saudável para a perpetuação de uma história? Até que ponto vale o processo de contação de um fato? Quando uma narrativa se desenvolve a partir de um eixo — ou conflito — fica evidente que tudo, a partir daquele ponto, deve sempre ser atraído para aquele epicentro, tal qual um ímã. Porém, em alguns casos, ainda que os fins sejam bem estabelecidos, a jornada pode ser extravagantemente desastrosa.
Joan, nova série do ITV e que chegará ao Brasil no próximo dia 06 de dezembro pelo Universal+, segue os passos de Joan Hannington, ou “A Madrinha”, como ficou conhecida em Londres. Os episódios exploram a ascensão da protagonista no submundo do crime londrino em busca de uma vida melhor para sua filha, Debbie.
Entre muito luxo e sutileza, o desenvolvimento da narrativa de Joan segue o caminho oposto ao luxo e ousadia que a protagonista pede — e vivenciou. Não precisa ir muito longe para encontrar artigos e informações sobre tal personagem e entender que sua história vai muito além, e é muito mais profunda, do que o que os 6 episódios se propuseram a narrar.
Ao deixar de lado todo o background e a infância conturbada da “Madrinha”, a produção britânica omite uma parte crucial de uma história que começa nos primeiros anos de vida daquela que futuramente viria a ser conhecida como “A Poderosa Chefona” de Londres na década de 80. Enquanto isso, opta por começar a narrar os eventos a partir de um casamento destruído e acabado, um divórcio que leva sua filha para longe pela falta de condições para criá-la.
A lacuna criada em Joan pela “desobrigação” de mostrar quão importante foi seu arco infantil no processo de concepção da sua vida adulta é algo que corrobora com a ausência de informações em um roteiro fraco, que não se justifica e nem tampouco preocupa-se em preencher lacunas. Se o fundamento é mostrar a história de uma mãe que envolve-se em pequenos — e às vezes grandes — furtos, falta-lhe a audácia para fazer o mínimo: costurar a história sempre reforçando o porquê daquelas escolhas.
Em dado momento, a construção da protagonista é feita de forma tão desleixada que dá a entender que tudo o que faz é por gostar do crime — e não para conseguir a guarda de Debbie. Enquanto isso, a filha vive entre idas e vindas ao orfanato tendo muito mais contato com a tia materna e apegando-se à realidades que porventura, diante de inúmeras possibilidades, podem existir onde ela e a mãe conviverão.
De longe, o maior dilema encontrado em Joan é a construção da história. O saber onde quer chegar não é o suficiente para construir um roteiro sólido e bem encaixado. As peças são jogadas aleatoriamente e “elas que lutem para fazer sentido”! Enquanto a personagem lembra-se do seu propósito apenas nos momentos finais de cada capítulo, o curso para chegar até ali dedica-se a aleatoriedades que focam, apenas, na sua acunha como “A Poderosa Chefona” do crime londrino — mas onde fica a Joan mãe e apaixonada pela filha enquanto isso?
Entre furtos e planos mirabolantes para outros novos roubos, a série ainda encontra espaço para desenvolver uma história de amor que não convence ninguém. A tentativa de criar uma relação de “partners in crime” é acelerada o suficiente para que, em momentos chaves de tal núcleo, surja uma aura de “não entendi” misturada com “como assim?”.
Ainda que o roteiro seja um desastre, a atuação de Sophie Turner consegue sustentar a produção. Tal qual uma joia, o item que a protagonista geralmente roubava, enquanto a atriz está em cena todas as atenções são atraídas para si. É como se um diamante estivesse sendo exposto — e, assim, o espectador não consegue se desvencilhar dela. Seja nos momentos como mãe e filha, amante apaixonada pelo magnata do crime ou presidiária impondo-se e dando as cartas na prisão, Turner reforça a grandiosidade e maturidade do seu talento.
O perpetuar da história de Joan pode até ser uma boa ideia. O porém encontra-se na maneira como isso foi feito e desenvolvido. Não cabe fazer recortes aleatórios e desconexos que deixam entreaberto lacunas e mais lacunas, gerando — muitas vezes — mais dúvidas do que respostas. Se a proposta era apresentar os limites de uma mãe e até onde ela pode ir para conseguir ficar ao lado dos seus filhos, faltaram argumentos, fundamentação e justificativa. As lacunas e hipóteses que permeiam tal assunto seguem entreabertas e a adaptação da história da “Madrinha” não foi capaz de respondê-las.
Joan tenta abraçar o luxo e a robustez de uma narrativa envolvente e atraente como uma joia, mas não consegue reforços para sustentar-se. Na tentativa de entregar uma pedra preciosa em 6 episódios, a produção só reitera a dificuldade encontrada em juntar recortes de uma história muito mais profunda e intensa do que aquilo visto em tela.
Nota: 7,50